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ATÉ RATO DE CIRCO DÁ LIÇÕES DE CIÊNCIA
[CENTRO][B]ATÉ RATO DE CIRCO DÁ LIÇÕES DE CIÊNCIA[/B] [CENTRO]* Luiz Eduardo Cheida[/CENTRO] Em plena noite de estréia, de lona montada, casa lotada, mulher barbada e anão expelidor de labaredas pelo funil das orelhas, o Gran Circo Aguaraçaí anunciou sua mais esplêndida atração: - O rato canguruuuuuuu!!! Um oh! percorreu o recinto, enquanto as lamparinas que iluminavam a casa de espetáculos voltavam-se para a gaiola miúda, deixada no centro do picadeiro por uma donzela ondulada, joelho de fora e fita no cacho do cabelo. Lá, bem dentro da gaiolinha, um rato de braços curtos, sentado nas longas pernas traseiras, em pose de canguru, empinava o nariz pontudo cheirando o ar. E o apresentador, entusiasmado: - Senhoras e senhores: este é o rato-canguru! Um pequeno mamífero que, mesmo vivendo no deserto, passa a vida inteira sem tomar sequer uma gota d'água. É o único vivente sobre a Terra que não precisa de água para viver! Uma obra prima da natureza. A cidade de Brejo Alegre nunca viu e nunca mais em tempo algum verá nada igual! Erguendo seus oitenta e cinco anos de uma das cadeiras que rodeavam o picadeiro, Ludovico Carneiro, farmacêutico prático e manipulador de essências, com a cidade passada e repassada no respeito à ciência de seus chás e purgativos, acionando o indicador acima da cabeça, protestou em voz de corneta: - Pois fique sabendo que para o rato-canguru, a água é tão indispensável quanto para o senhor ou para mim. A platéia, que aplaudia, silenciou. - Esse rato ? continuou - extrai a água de que necessita das sementes que ingere, ricas em lipídeos*. Pode-se dizer que ele fabrica a própria água através de seu estranho metabolismo*. Entretanto, a planta de cuja semente alimenta-se não vive sem água. Dessa forma, seu moço, embora ele passe a vida sem beber, ele bebe a semente que bebeu do solo. - Saiba, então, que, até este pequenino vivente, que por aparência despreza a água, não suportaria viver sem ela um dia sequer! E que suas informações são cientificamente equivocadas. - E boa noite! Puxando dona Ermelinda Carneiro pelo cotovelo, Ludovico Carneiro dependurou o guarda-chuvas no antebraço e saiu porta afora. A multidão o acompanhou. Afinal, se o circo falava besteira até de rato, com certeza a mulher barbada tinha bigode postiço e o anão bota-fogo nem orelha de fornalha deveria ter. Manhã cedo, com a lona nas costas, o Gran Circo Aguaraçaí deixou Brejo Alegre. Por ironia, debaixo de forte aguaceiro. Um forte abraço e até sexta que vem. * Luiz Eduardo Cheida é médico, deputado estadual e presidente da Comissão de Ecologia da Assembléia Legislativa do Paraná.[/CENTRO] ...


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