AO MENOS DEIXEM OS PREGOS
*Por Percival Puggina
Reafirmo meu pessimismo: mais cedo ou mais tarde, como vem ocorrendo com todas as teses provenientes desses segmentos ideológicos e polÃticos, os crucifixos serão arrancados das paredes. E o resÃduo cultural cristão ainda persistente continuará cedendo lugar a um humanismo desumano, destituÃdo de alma e avesso a Deus. Avesso ao Deus cuja proteção é invocada na Constituição. Não guardo ilusões. Quando se encontra com a omissão de muitos e a ingênua tolice de outros tantos, a malÃcia passa por cima e impõe o que pretende com quase nenhuma resistência.
Aparentemente é uma questão simples. Afinal, se o Estado é laico, os espaços públicos ou sob responsabilidade do Estado não deveriam ser isentos de qualquer religiosidade, como banheiros de estação? O crucifixo, na parede de uma repartição, seria, nessa perspectiva, um atropelo à equidade, um agravo à Constituição e à Justiça. Remova-se, então. Mas tenha-se a coragem de assumir perante a história o registro do que foi feito: preserve-se o prego! Preserve-se o prego para que todos reconheçam o extraordinário serviço prestado. Para que todos saibam que ali havia um crucifixo, e que ele foi removido por abusivo, ofensivo, intolerável à s almas sensÃveis que, em nome da Justiça, se mobilizaram contra ele.
Observe de onde procedem os ataques aos crucifixos. Nem todos os que tocam nessas bandas são contra os crucifixos e nem todos o são por malÃcia. Mas todos os que se opõem aos crucifixos tocam nessas bandas. Tocam numa certa esquerda e numa certa direita. Ajudam-se mutuamente no processo de destruição dos valores. A cara da utopia da igualdade é o focinho da utopia da liberdade sem limites. Quando discorrem sobre seus motivos em relação aos crucifixos, transmitem a ideia de estarem jungidas a um imperativo constitucional - o Estado, mesmo não sendo ateu, é laico. Não tem religião própria. E os ingênuos abanam a cabeça em concordância: afinal, se há lugar para um crucifixo, por que não revestir as paredes com os sÃmbolos de todas as outras religiões e crenças existentes? Ou tem para todos, ou não tem para ninguém. Com tanta coisa contra que lutar, escalam como adversário Jesus de Nazaré.
O crucifixo na parede da repartição não é peça publicitária. Não é elemento de proselitismo religioso. Não transforma o espaço em local de culto. à referência a um patrimônio de valores universais sem similar na iconografia humana: amor a Deus e ao próximo mesmo se inimigo, solidariedade, justiça, misericórdia, paz. Se tirar o crucifixo, fica o prego.
Por outro lado, percebam todos ou não, a mobilização pela remoção é apenas mais um ato da longa empreitada do relativismo, do hedonismo e do materialismo visando à deliberada destruição das bases da civilização ocidental. Apenas mais um gesto. Querem a prova? O mesmo argumento que pretende a remoção do crucifixo (o mesmÃssimo argumento!) quer silenciar os cristãos sempre que se debatem aspectos morais de propostas legislativas ou decisões judiciais. "O estado é laico e os argumentos baseados numa moral de origem religiosa não podem ser admitidos!", proclamam com enfatuada sabedoria. Ou seja, admitem-se nos debates as opiniões de ateus, de movimentos sociais, de sindicatos, de homossexuais, de partidos polÃticos, de endinheiradas ONGs, do que for. Admite-se opiniões do Além, psicografadas. Vale, até, opinião de quem não tem moral alguma. Mas não se toleram opiniões coincidentes ou fundadas na moral cristã. Pasmem os leitores: com esses argumentos de almanaque, com essa lógica de gibi, se consideram gênios da retórica, porta-estandartes da equidade. E não faltam ingênuos para aderir a essa conversa mole!
No entanto, saibam quantos lerem este artigo: o comunismo, ao refletir sobre suas dificuldades para expandir-se na Europa Ocidental, concluiu que seus maiores obstáculos estavam propostos pelas bases cristãs da cultura vigente. Desde então tem sido o que se viu. E só não percebe quem não se importa em servir de pomba para a refeição dos gaviões.
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* Percival Puggina é arquiteto, escritor e articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no paÃs.
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