A verdade sobre os riscos do álcool líquido
A PROTESTE Associação de Consumidores, integrante da Frente Nacional de Combate aos Acidentes com Álcool, rebate a virulência mercantilista expressada pelo presidente da Associação Brasileira dos Produtores e Envasadores de Álcool (Abraspea), José Carlos de Rezende, em artigo extremamente tendencioso e ofensivo à PROTESTE, divulgado na imprensa. Faz acusações gravíssimas e levianas sobre a proibição da venda de álcool em forma líquida no mercado nacional.
O ponto de partida do movimento foi o inconformismo da Abraspea em relação à Resolução nº 46/2002, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que por questão de segurança pretendia a extinção do álcool líquido com graduação acima de 54º e a sua consequente substituição pelo álcool gel. Seis meses após vigorar a Resolução, a Abraspea obteve liminar na justiça para a suspensão da proibição da venda do produto.
A resolução estabelecia entre outras determinações, que ?..o álcool etílico comercializado com graduações acima de 540GL (cinquenta e quatro graus Gay Lussac) à temperatura de 200C (vinte graus Celsius) deverá ser comercializado unicamente em solução coloidal na forma de gel desnaturado e no volume de 500g em embalagens resistentes ao impacto.? Além disso, a norma determina que ?...os produtos formulados à base do álcool etílico hidratado comercializados com graduações abaixo ou igual a 540GL à temperatura de 200C, deverão conter desnaturante de forma a impedir seu uso indevido?.
A Abraspea tem grande interesse econômico na venda massiva do álcool líquido, e está, ainda, inconformada com um Acordão do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, publicado em agosto último, que reconhece o direito de a Anvisa restringir ou proibir a comercialização do álcool em forma líquida para fins de limpeza doméstica, em todas as suas formas, até o consumidor final. Há dez anos, após o retorno do álcool liquido ao mercado a PROTESTE e demais integrantes da Frente Nacional, vêm se mobilizando. O objetivo é alertar para o perigo que o produto na forma líquida representa, principalmente para as crianças, que anualmente tornam-se vítimas de queimaduras com riscos de morte ou comprometimento da integridade física e psicológica.
No desespero de buscar argumentos que justifiquem seu interesse puramente comercial e financeiro, o presidente da Abraspea acusa a PROTESTE, sem qualquer prova, de tentar beneficiar empresas multinacionais do setor de limpeza. Trata-se de verdadeiro absurdo e contrassenso. A PROTESTE não possui qualquer interesse ou ligação com fabricantes de produtos de limpeza ou de qualquer outro produto, e não poderia ser diferente nesse caso, pois a organização é uma entidade civil sem fins lucrativos, apartidária, independente de governos e de empresas. Entre seus objetivos desde 2001 quando foi criada, estão a defesa e o fortalecimento dos direitos dos consumidores brasileiros. É a única entidade no Brasil que faz testes comparativos, com o intuito de melhorar a qualidade dos produtos e não poupa esforços para indicar os melhores e piores produtos de qualquer fabricante, após a realização dos testes.
Produtos de limpeza sempre estiveram entre os produtos testados pela PROTESTE e, muitas vezes, foram reprovados pela falta de qualidade ou por conter alguma substância que pusesse em risco a segurança e a saúde dos consumidores. Entre eles tivemos os testes com alvejantes, amaciantes de roupa, detergentes, sabão em pó, e muitos outros, o que pode ser conferido no site (www.proteste.org.br).
Ao contrário das alegações dos fabricantes de álcool, os dados utilizados pela Anvisa não foram criados pela PROTESTE. São informações de caráter público. Quando a PROTESTE afirma que os acidentes com álcool líquido somam 150 mil por ano no Brasil, utiliza dados da Sociedade Brasileira de Queimaduras.
José Carlos de Rezende, em total desrespeito aos diversos leitores dos veículos nos quais seu artigo foi publicado, não cita quais empresas estariam sendo favorecidas pela PROTESTE, e também não menciona qual o fundamento dessa afirmação que pode caracterizar, inclusive, sua responsabilização.
A PROTESTE não está sozinha nessa luta! A Frente Nacional de Combate aos Acidentes com Álcool é formada por Entidades sérias e preocupadas com a saúde e segurança dos consumidores brasileiros, dentre elas a Associação Médica Brasileira (AMB), a Criança Segura Safe Kids Brasil, a Associação Paulista de Medicina (APM), a Aldeias Infantis SOS Brasil, a Aliança pela Infância, a Associação Cristã de Moços do Brasil, a Associação dos Conselheiros Tutelares do Estado de SP, a Avante-Educação e Mobilização Social, o Conselho Federal de Psicologia, o Corpo de Bombeiros do Estado de SP, a Federação Nacional das APAEs, o Fórum Nacional Pela Primeira Infância, a Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, o Instituto Zero a Seis, o Movimento Nacional de Direitos Humanos, a Rede Nacional da Primeira Infância, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Pediátrica, a Sociedade Brasileira de Pediatria e a Sociedade Brasileira de Queimadura.
É lamentável ler um artigo que vai na contramão do bom senso e das melhores práticas mundiais sobre segurança, assacando sérias acusações a entidades respeitadas, que se utilizariam de falsos argumentos, o que é ainda mais grave principalmente por ter sido escrito com base em informações distorcidas, fornecidas por uma entidade que tem como principal e único interesse, o econômico, na liberação desse produto.
De forma totalmente desrespeitosa com a sociedade brasileira, o presidente da Abraspea considera um número irrelevante a ?média de três mil casos anuais de internação por exposição à combustão de todas as substâncias inflamáveis?. Ele esquece o fato de que a queimadura causada pelo álcool não deixa somente números. As consequências são imensuráveis, como o comprometimento do desenvolvimento saudável da vítima ? que, se não for a óbito, poderá ter de se submeter a cirurgias durante anos, responsável por afastamentos temporários e permanentes do trabalho e causador de sequelas graves que afastam as crianças da escola e do convívio social, além de provocar traumas emocionais para a vítima e sua família.
O álcool líquido, portanto, tem se mostrado um agente perverso, causador de extensas queimaduras, que deixam sequelas permanentes. Segundo dados de 2011 do Datasus/Ministério da Saúde, exatamente 2.374 crianças foram hospitalizadas vítimas de queimaduras por exposição ao fogo, fumaça e chamas. Desse total, 30% estavam ligados a queimaduras com substâncias inflamáveis, que incluem o álcool, ou seja, cerca de 2 crianças hospitalizadas a cada dia.
Neste mesmo ano, os gastos com a hospitalização das vítimas destes acidentes alcançaram R$ 7.481.352,35. Normalmente, são casos que exigem internação em Unidades de Terapia Intensiva, com custo diário em torno de R$ 3 mil ou mais, dependendo da situação do paciente. Entretanto, o que nos deixa ainda mais preocupados é que, provavelmente, esse número seja muito mais elevado, uma vez que grande parte dos casos não são registrados nos hospitais brasileiros. Lamentavelmente, não temos no país um Cadastro Nacional obrigatório para registro dos Acidentes de Consumo, o que exporia a verdadeira dimensão deste drama.
Reiteramos nosso posicionamento pela urgente necessidade de restrição da venda do álcool para fins domésticos, conforme já reconhecido pelos três Poderes Nacionais. O interesse da PROTESTE tem como único objetivo garantir o bem estar social, preservando a saúde e segurança do consumidor brasileiro, bem como sensibilizar a população, juntamente com a Frente Nacional, para que os interesses do setor produtivo não se sobreponham ao atual quadro de acidentes graves com álcool no País, plenamente evitáveis se medidas de precaução adequadas fossem adotadas, entre elas a adoção das melhores e mais seguras práticas de comercialização e manuseio de álcool líquido.
*PROTESTE - Associação de Consumidores.
...