AS MULHERES E AS ORGANIZAÇÕES
*Por Renato Ladeia
A comemoração do Dia Internacional da Mulher (8 de março) sugere algumas reflexões sobre o impacto do gênero nas organizações, sejam elas de natureza pública, privadas voltadas para o lucro ou de natureza social. Primeiramente, parece-me equivocado ter um dia da mulher, pois todos os dias são das mulheres e elas sem dúvida merecem isso. Porém, se é para comemorar uma data deveria ser o dia dos direitos da mulher, que soaria mais adequado e evitaria as críticas machistas de que deveria ter, também, o dia internacional dos homens.
A situação da mulher mudou ao longo dos últimos 2 mil anos, principalmente no Ocidente, onde os direitos de cidadania já fazem parte do cotidiano na maioria dos países. Ao lembrar que o filósofo grego Aristóteles afirmava que ao homem é permitido castigar a sua mulher, seus filhos e escravos porque eles a ele pertencem, tem-se a clara noção do papel feminino na antiguidade. O episódio bíblico em que uma mulher prestes a ser apedrejada por uma multidão ensandecida é socorrida por Jesus que desafia a horda com ?Atire a primeira pedra...?, pra mim é o momento de uma clara ruptura dos padrões patriarcais da sociedade judaica com o advento do Cristianismo, que dá à mulher um novo status social.
Mas é mesmo com o advento do Capitalismo e a Revolução Industrial que ocorre uma mudança fundamental no papel da mulher na sociedade. A necessidade de braços para movimentar as fábricas faz com que os empresários recrutem além dos homens disponíveis, mulheres e crianças para atender as demandas crescentes de produção. As jornadas de trabalhos eram longas e estressantes sob condições de trabalho insalubres e sob o comando de capatazes que exauriam as forças do trabalhador até o limite máximo, às vezes até com violência. As mulheres, além do trabalho nas fábricas ainda cumpriam, como até hoje é comum nas classes menos abastadas, uma segunda jornada para dar conta das tarefas domésticas.
É sempre bom lembrar que a mulher passou a ter direito de votar apenas nos anos 30 do século passado, mesmo nos EUA e Europa, quando os movimentos sufragistas obtiveram a primeira significativa vitória da luta da mulher contra o poder patriarcal. A sociedade mudou e a educação das meninas de classe média e alta não ficou restrita à escola normal. Impulsionadas pela onda transformadora, foram também para as universidades, que a partir dos anos 1940, no Brasil, começaram a ter crescente presença do gênero feminino nas salas de aula. Em meados dos anos 1950, notícia de jornal deu conta que uma jovem estava frequentando uma escola de Administração em São Paulo, fato inusitado para os padrões da época. Hoje nas salas de aula dos cursos de Administração as mulheres já são maioria.
Até pouco tempo o papel das mulheres nas organizações se restringia às atividades de apoio, como secretárias, telefonistas, copeiras etc. Hoje o sexo feminino está galgando os mais diversos níveis nas estruturas hierárquicas, criando nova realidade organizacional. Estudos organizacionais realizados em fins do século passado analisavam o papel das mulheres como executivas, concluindo que a maioria delas assumia um estilo masculino de gestão com o objetivo de se impor diante de homens que não aceitavam um comandante de saias.
Mas nem tudo ainda é um mar de rosas. Há muito ainda a fazer para que o sexo feminino conquiste a plena cidadania organizacional. A maioria das mulheres ainda recebem salários inferiores aos homens, mesmo exercendo as mesmas funções. O preconceito de gênero ainda é forte colocando as mulheres mais como objeto sexual do que como colegas de trabalho. O conflito de gênero é o resultado da ruptura de longa tradição, arraigada em nossa cultura que tem na base de formação uma estrutura social oligárquica, patriarcal e escravista. O assédio moral e sexual em função da presença feminina nas empresas, infelizmente, ainda é um sério problema a ser resolvido pela legislação e gestores.
Por outro lado, já é possível afirmar que a presença feminina nos diversos escalões vem engendrando saudável mudança no clima organizacional da maioria das empresas. O humanismo, muito mais presente nas mulheres pela condição da maternidade, pode fazer as organizações se tornarem locais mais acolhedores, não só de gênero, como também racial, étnica, religiosa e cultural.
*Renato Ladeia é professor do curso de Administração do Centro Universitário da FEI (Fundação Educacional Inaciana)
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