O consumidor e os produtos vencidos
O consumidor e os produtos vencidos
* Arthur Rollo
Infelizmente é comum, especialmente em supermercados, a constatação de produtos expostos à venda com prazo de validade vencido. O consumidor inadvertido acaba comprando e, muitas vezes, acha que o produto venceu na geladeira e não reclama. Maus fornecedores acabam utilizando artimanhas para empurrar para os consumidores produtos que deveriam ir para o lixo.
Outra prática muito comum no mercado é a comercialização de produtos prestes a vencer. Normalmente essa comercialização é feita sob a forma de promoções e o consumidor, achando que está fazendo um bom negócio, acaba comprando vários produtos que não terá tempo de consumir. Comercializar produto no fim do prazo de validade é permitido, mas o consumidor deve ser informado de que terá que consumi-lo em curto prazo. Já ouvimos relatos de novas embalagens de produtos vencidos a fim de enganar os consumidores. Essa prática é ainda mais reprovável, porque configura adulteração de produto.
O art. 18, §6° do CDC afirma que são impróprios ao consumo os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos. Vale dizer, aquele que compra o produto nessas condições tem o direito de optar pela sua substituição por outro dentro do prazo de validade ou pelo desfazimento do negócio, ou seja, a devolução do produto pelo consumidor e do dinheiro pago pelo fornecedor.
A nosso ver tem essas mesmas opções aquele consumidor que adquire o produto na véspera do vencimento, porque a falta de informação acarreta o vício. Ainda que o produto possa ser comercializado, se o vencimento é iminente o consumidor deve ser informado a respeito, já que pode optar por não adquirir, por adquirir uma única unidade, etc..
Nos dias de hoje o consumidor passa correndo pelo supermercado e não se detém olhando os prazos de validade. Se passar a fazê-lo, vai perceber que é comum a exposição à venda de produtos com prazos de validade vencidos. E isso não devia acontecer porque essa conduta configura crime definido pelo art. 7º, IX da Lei n° 8.137/90. A lei dos crimes contra as relações de consumo tipifica como crime: ?vender, ter em depósito para vender ou expor à venda ou, de qualquer forma, entregar matéria-prima ou mercadoria, em condições impróprias ao consumo.?, sendo a pena incidente a detenção de dois a cinco anos ou multa.
Infelizmente, a falta de delegacias especializadas prejudica a apuração de todos os crimes contra as relações de consumo, já que a falta de estudo específico leva à ignorância das inúmeras leis que tipificam condutas nesse setor. Na prática, dificilmente o tipo específico é aplicado, sendo utilizados os crimes genéricos do Código Penal, o que redunda na má condução da fase inquisitorial.
A falta de treinamento do pessoal e de equipamentos para a conservação dos produtos quase sempre inviabiliza a perícia, porque não se sabe se o produto estava estragado na prateleira ou se estragou na sua apreensão, no seu transporte ou na delegacia, porque não foram tomadas nessas fases as indispensáveis medidas de conservação. No nosso entender, trata-se de crime de perigo abstrato já que o CDC afirma que produtos com prazo de validade vencido são impróprios ao consumo. Todavia, nossos Tribunais vêm exigindo o perigo concreto, vale dizer o potencial do produto de prejudicar a saúde do consumidor. Em virtude desse entendimento, falhas na apreensão e conservação dos produtos obstam a ação penal.Muito embora a ?criação de delegacias de polícia especializadas no atendimento de consumidores vítimas de infrações penais de consumo? tenha sido definida pelo art. 5º, III do CDC como um dos instrumentos da Política Nacional das Relações de Consumo, infelizmente poucos Estados as têm, fator que vem contribuindo para a proliferação dos crimes contra as relações de consumo.
Enquanto não existe a conscientização por parte dos fornecedores e não são criadas as delegacias especializadas, o consumidor deve redobrar sua atenção a fim de evitar a compra de produtos vencidos. Constatando a exposição à venda de produto vencido, deve comunicar à autoridade policial posto que configurado, em tese, crime contra a relação de consumo. Se só vier a perceber que o produto estava vencido após a aquisição, poderá também solicitar a devolução do dinheiro ou a troca do produto por outro dentro do prazo de validade.
* Arthur Rollo é mestre e doutorando em direitos difusos e coletivos pela PUC/SP
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