Alívio: frustrada tentativa de desocupação do Novo Urupá
>A ação judicial foi adiada por mais 15 dias. Os moradores têm interesse em comprar a área
Reportagem Especial Josias Brito
As mais de 30 famílias que estavam residindo numa área formada por 40 lotes, que supostamente pertence a quatro irmãos, sofreram uma tentativa de desocupação no início desta semana. A ordem judicial foi entregue aos moradores, na manhã da última segunda-feira (5), por três oficiais de justiça. A tentativa de desapropriação da área teve a participação de 23 policiais militares, tanto do Grupo de Operações Especiais, como oficiais, canil e do Meio Ambiente. Há mais de dois anos que as famílias tentam um acordo. A policia não conseguiu efetuou a desocupação do local.
Segundo o comandante do 2º Batalhão da Polícia Militar em Ji-Paraná, tenente coronel Márcio Ângelo Pinto, o comando recebeu a ordem judicial na semana passada, onde o Poder Judiciário determinava que fosse cumprida a reintegração de posse na área. ?Fizemos um estudo logístico no local, para evitarmos um conflito, após estes levantamentos, cumprimos a ordem judicial, mas no momento da retirada dos moradores, houve uma mudança radical e a desocupação foi suspensa provisoriamente?, ressaltou o comandante.
Um dos proprietários da área, citado na ordem judicial, Marcos Vinicius Queiroz de Cavalcanti disse que as 30 famílias já deveriam ter saído do local há muito tempo. Ele informou que, desde 2008, os irmãos tentam a reintegração de posse na Justiça, e somente agora, teve a decisão final dando ganho de causa a ele e os outros irmãos. ?Isso é um lote, casas no meio da rua foram construídas, e até água foi instalada aqui pela Companhia de Água e Esgoto do Estado de Rondônia (Caerd)?, declarou.
A companhe a reportagem especial feita pela equipe do CP. Autoridades e moradores falam sobre a situação da área, o investimento que fizeram no local e o que esperam da justiça para que seja resolvida a situação no local.
Proprietários fazem acordo com invasores
Os proprietários da área invadida por famílias no bairro Novo Urupá, em Ji-Paraná, num acordo entre ambas as partes, pretendem negociar os lotes com as pessoas que fizeram benfeitorias no local. Segundo o representante do grupo, Marcos Vinícius Queiroz Queiroz de Cavalcanti, ele e seus irmãos, mesmo com o ocorrido, ficaram sensibilizados com a situação das famílias no local e, resolveram mudar a estratégia da reintegração. A negociação deverá ser feita, nos próximos dias, por uma imobiliária de Ji-Paraná.
Um dos moradores do local, Marcos Vieira Dutra, 27 anos, disse ser casado e pai de um filho de dois anos de idade. Conforme ele, a família não tem para onde ir. ?Vou deixar minha mudança em casa de parentes. Não sei o que fazer?, relatou.
Maria dos Santos, 45 anos, pediu demissão do emprego para tentar assegurar seu pedaço de chão. Ela queria se livrar do aluguel de R$ 280 que pagava por um barraco de dois cômodos. Ela reclama que há muito tempo está registrada em programas habitacionais para receber um lote e nunca é premiada. "Se eu ficar com um terreno, mesmo pagando por ele, não tem tempo ruim", espera.
Sentado de baixo da mesma árvore que Maria, o servente de pedreiro Antônio José Correia, 38 anos, conta que ficou sabendo da invasão no início do ano passado e resolveu tentar a sorte porque não quer mais pagar aluguel. Ele e a mulher, Maria dos Santos, têm três filhos e pretende, mesmo com dificuldade, garantir um lugar próprio para morar.
Madalena Ferreira tem o mesmo raciocínio. Desempregada, ela ficou sabendo da "expansão" pelo boca a boca na cidade e participou da invasão desde o começo. Em sua casa de madeira, ainda sem terminar, vive com duas crianças. "Quem arrisca, não petisca. Vou fazer o sacrifício de ficar e conseguir meu lote", conta.
Os moradores aceitaram negociar com os proprietários a compra do lote onde foram construídas as casas. ?Vamos fazer o possível para continuarmos aqui. Iremos tentar negociar da melhor maneira possível e, mesmo com dificuldades, pagaremos por nossa moradia. É o melhor para nós todos?, ressaltaram.
Marcos Vinícius informou que a área será administrada por uma imobiliária de Ji-Paraná, que ficou responsável em fazer a medição do local e a venda dos terrenos. ?De início, iremos dar prioridade para as famílias que residem na área invadida. O valor a ser pago por estas pessoas será de aproximadamente R$ 15 mil, podem ser divididos em parcelas de R$ 125 por mês?, enfatizou Vinícius.
Comandante enaltece iniciativa de comunidade
O comandante do 2º Batalhão da Polícia Militar em Ji-Paraná, tenente coronel Márcio Ângelo Pinto, elogiou a iniciativa da comunidade durante uma tentativa de reintegração de posse realizada no início desta semana no bairro Novo Urupá, em Ji-Paraná. Segundo ele, a população do município é muito ordeira e com isso, a operação foi pacífica e não houve emprego de nenhum tipo de força física. A reintegração teve a participação da Polícia Militar, do Conselho Tutelar e da Secretaria de Ação Social do município.
Coronel Ângelo disse que mesmo durante o primeiro contato com as famílias de invasores, na semana passada, juntamente com o oficial de justiça, as pessoas demonstraram otimismo e em nenhum momento apresentaram estarem revoltados com a decisão judicial. De acordo com o comandante, as reintegrações de posse segue todos os critérios de segurança. ?Primeiramente uma equipe elabora e monta um estudo da área, atentando a todos os elementos favoráveis a reintegração, antes do cumprimento da ordem judicial. Se for necessário, é feito uma foto aérea?, enfatizou.
A preocupação, enfatizou coronel Ângelo é com as famílias: ?Se vamos remover as famílias da área, pra onde vão ser elas serão levadas? A justiça terá que dizer onde serão alojadas. Porque quando a polícia faz a reintegração, cria-se um problema social?, informou. Um outro fator muito importante é referente ao investimento que estas pessoas fizeram no local. ?Sempre procuramos fazer a comunicação antes, para que as famílias possam desmanchar suas benfeitorias, tirar suas mobílias, pois sabemos que querendo ou não, elas tiveram um custo para fazer suas moradias, por mais simples que sejam seus casebres?, ressaltou.
AÇÕES DIFERENTES ? Para coronel Márcio Ângelo, fica difícil fazer uma comparação das ações de reintegração de posse entre os municípios de Ji-Paraná e Porto Velho, pois lá foi uma situação atípica. ? Tivemos a participação de várias autoridades políticas, isso as vezes aumenta os ânimos e a resistência. O que aconteceu lá, eu sou suspeito para falar, pois sou militar e pode parecer que minha opinião não é isenta. Não posso julgar a ação de um comandante. Tivemos um caso no passado, em Corumbiara e de lá pra cá não tivemos nenhum incidente grave a não ser este?, concluiu o comandante.
Reintegração é suspensa por ordem judicial
A reintegração de posse da área remanescente que pertencia a Superintendência de Desenvolvimento Centro Oeste (Sudeco), que havia sido tomada de posse por algumas famílias, teve a ação suspensa pela justiça. Tanto as famílias, como os atuais proprietários tem um prazo de 15 dias, determinado pela Justiça, para entrarem num acordo.
O comandante da operação de reintegração de posse, capitão Oziel Paradella, informou que a ação para reintegração foi impetrada na justiça pelos próprios proprietários da área. O processo levou a justiça determinar que fosse retirada as pessoas do local, que haviam dividido a área em pequenos lotes.
?Fomos com o oficial de justiça até o local e um fato relevante, foi que a justiça não determinou a demolição das residências e que fossem retiradas apenas as pessoas e seus pertences do local?, ressaltou capitão Paradella. Segundo o comandante da operação, as famílias foram avisadas sete dias antes que haveria a reintegração. ?Nesta operação, solicitamos a presença da imprensa; conselho tutelar, devido à existência de crianças na área e representantes da secretaria de ação social do município. Todos estes órgãos estavam lá presentes?, informou capitão Paradella.
O comandante disse ainda que as atividades começaram por volta das 7 horas da manhã da última segunda-feira (5), onde ficou acertada a saída pacifica das famílias do local. Segundo o Capitão Paradella, por volta das 11 horas, o oficial de justiça recebeu uma ordem judicial suspendendo a ordem anterior de reintegração. ?Não sabemos o que houve, se teve uma negociação, mas, de qualquer forma, recolhemos nosso efetivo militar empregado na operação para o 2º Batalhão da Polícia Militar em Ji-Paraná e demos por finalizada a operação. Por parte da policia militar, cumprimos a ordem judicial, sem transtorno nenhum?, concluiu capitão Paradela.
Roseli Pereira das Neves, 45 anos
Foi a intenção de conseguir uma moradia que levou as famílias a invadirem áreas que pertenciam a Superintendência de Desenvolvimento Centro Oeste (Sudeco), e hoje é de propriedade de quatro irmãos. Roseli Pereira das Neves, 45 anos, está há cerca de dois ano na quadra do bairro Novo Urupá, local em que houve uma tentativa de reintegração de posse nesta semana.
?Mas nem sabemos se vamos ficar aqui?, disse. Ela conta que já passou frio, viveu debaixo de uma lona por mais de sete meses em companhia de uma neta e, com ajuda de seu filho, que trabalhava por diária, conseguiu construir uma casa. ?Mas paramos de mexer porque pode ser necessário sair?, afirmou. Antes de se mudar para a área ela pagava aluguel de R$ 50 por mês em uma casa do bairro Urupá. ?Pagava aluguel e na hora de dormir era obrigada passar a noite na casa de vizinhos pois não havia lugar na residência para eu e minha neta ficarmos. Mas, fui convidada a ter meu próprio lugar para morar e acabei vindo parar na invasão, onde estou até hoje?, ressaltou.
Há dois anos, fui retirada do local pela justiça, mas depois de 20 dias, retornei, devido ao investimento que fiz. ?No inicio, havia dia que amanhecia toda molhada pela chuva, pois não tinha um local adequado para ficar, tendo somente como proteção, um pedaço de lona todo furado?, enfatizou.
A moradora espera que os proprietários da área e a justiça entrem num acordo, mesmo que seja para eles pagarem pelos terrenos invadidos. ?Não tenho para onde ir e dependo muito deste local para morar?, concluiu.
Geralda Abda Vieira ? Aposentada ? 54 anos
A aposentada, que é responsável pela criação de três netos, disse a reportagem do CP que investiu mais de R$ 37 mil na construção e instalação de água e luz no local. Muito emocionada e ainda abatida pela ação de reintegração de posse, ela fez um desabafo.
Segundo Geralda Abda, uma semana antes da ação judicial, o oficial de justiça, com um forte esquema de segurança, veio até o local, achando que eles eram mal elementos. ?Se não tivesse crianças na comunidade, eles teriam sido retirados na última segunda-feira (29)?, comentou a aposentada.
Ela disse ainda que nunca foi numa delegacia. ?A única vez que fui num distrito policial, foi quando perdi meus documentos que estavam dentro dos estudos evangélicos e foi entregue a algum detento no Presídio Central de Ji-Paraná e, por isso tive que ir a delegacia registrar uma ocorrência de perda dos documentos?, informou.
Bastante doente, a aposentada, que vive a base de remédios, disse ainda que sempre trabalhou no pesado. ?Chorei muito quando chegaram e falaram que nós teríamos que sair do local imediatamente, mas, Deus não permitiu que eles fizessem a reintegração?, ressaltou.
Conforme a moradora, a principio o deputado estadual Euclides Maciel estava ajudando eles e conseguiu descobrir que a área não pertencia mais a Sudeco e sim a um grupo de irmãos. ?O deputado comprovou que o local não estava na área do órgão federal, sendo que depois da descoberta foi que apareceu os donos e disseram que tem documentação do local?, informou Geralda Abda garantindo que as ruas que estão no processo não fazem parte da invasão e sim de outra quadra no mesmo bairro.
Conforme a aposentada, ao ver o aparato policial, ficou bastante triste, pois na área invadida não vive nenhum criminoso, mas sim famílias trabalhadoras. ?Sou evangélica e nunca invadi propriedade de ninguém e nem passei por isso. Se eu soubesse que o local era uma invasão, não teria vindo para cá. Antes de vir para a área, uma pessoa chegou para mim e disse se eu queria ganhar um terreno. Quem não quer ganhar um local para morar??, concluiu a moradora enfatizando ainda que se não fosse Deus, hoje eles estavam com seus pertences na rua.
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